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3-1

Arjuna disse: Ó Janārdana, ó Keśava, por que você me envolve neste terrível combate, se você considera que a inteligência é melhor do que a ação fruitiva?

Explicação: Neste verso, Arjuna expressa sua incompreensão e dúvidas sobre as instruções de Krishna. Arjuna ouviu de Krishna que a sabedoria e a contemplação são consideradas um caminho espiritual superior à ação, e é por isso que ele pergunta por que Krishna o está instruindo a participar de uma batalha terrível, o que parece contradizer o caminho espiritual superior. Arjuna se dirige a Krishna como Janārdana (o mantenedor dos homens) e Keśava (o matador do demônio Keśi, Vishnu), pedindo uma resposta que o ajude a compreender essa aparente contradição. Este verso aponta para as dúvidas internas de uma pessoa sobre qual é o caminho correto entre ação e sabedoria.

3-2

Minha inteligência está confusa com suas instruções aparentemente ambíguas. Portanto, por favor, diga-me definitivamente qual é o caminho mais vantajoso para mim.

Explicação: Neste verso, Arjuna expressa sua confusão e a sensação de que sua mente está perdida. Ele indica que as palavras de Krishna parecem contraditórias para ele - por um lado, a sabedoria e a contemplação são enfatizadas, por outro lado, a ação é colocada em primeiro plano. Essa contradição confunde Arjuna, que é incapaz de entender qual caminho escolher.

3-3

O Senhor Supremo disse: Ó Arjuna sem pecado, Eu já expliquei que há dois tipos de homens que tentam realizar o eu. Alguns procuram fazê-lo através da especulação filosófica empírica, e outros através do serviço devocional.

Explicação: Neste verso, Krishna explica os dois caminhos espirituais que ele explicou anteriormente às pessoas para ajudá-las a alcançar a perfeição espiritual. Ele se dirige a Arjuna como o sem pecado, enfatizando a pureza de Arjuna e sua capacidade de seguir esses caminhos. • O caminho do conhecimento destina-se aos inteligentes ou intelectuais que buscam a iluminação através do conhecimento e da contemplação. Este caminho baseia-se na compreensão interior de si mesmo e do Universo. • O caminho da ação destina-se àqueles que praticam a ação altruísta, renunciando completamente ao apego aos resultados. Este caminho é adequado para aqueles que são ativos na vida e desejam alcançar a perfeição espiritual agindo com altruísmo.

3-4

Não abstendo-se do trabalho, pode-se livrar-se de novamente trabalhar, nem simplesmente renunciando ao trabalho, pode-se alcançar a perfeição.

Explicação: Muitas vezes pensa-se que, renunciando à ação ou vivendo passivamente, pode-se evitar a ação, mas Krishna indica que a perfeição não é alcançada apenas com passividade ou renúncia, a menos que esteja ligada à compreensão interior e à ação altruísta. A perfeição é alcançada quando o homem entende como agir sem apego e sem desejo pelos frutos da ação, ou seja, através da ação-disciplina espiritual.

3-5

Todos são forçados impotentemente a agir de acordo com as qualidades que adquiriram das qualidades da natureza material; portanto, ninguém pode abster-se de agir, nem por um momento.

Explicação: As qualidades do caráter da natureza humana (três qualidades materiais - bondade, paixão e ignorância) fazem com que ele aja e esteja ativo constantemente. Assim, a ação é uma parte inevitável da vida, e evitar as ações por si só não é uma solução no caminho espiritual. Em vez disso, é importante entender como agir corretamente, não se prendendo aos frutos da ação.

3-6

Aquele que restringe os órgãos de ação, mas cuja mente se detém nos objetos dos sentidos, certamente engana a si mesmo e é chamado de hipócrita.

Explicação: Neste verso, Krishna explica que o verdadeiro autocontrole não significa apenas abstenção externa da ação. Se um homem controla suas ações externas, mas sua mente continua apegada aos objetos dos sentidos (desejos, objetos de prazer), ele está enganando a si mesmo. Essa atitude é chamada de hipocrisia, porque externamente ele parece controlado, mas internamente sua mente ainda está preocupada e imersa nos desejos mundanos. Este verso ensina que o progresso espiritual só é possível se tanto os sentidos quanto a mente forem controlados. Só então uma pessoa pode alcançar verdadeira harmonia e paz interior, e não viver em hipocrisia.

3-7

Por outro lado, se um homem honesto se esforça para controlar com a mente os órgãos de ação e sem apego começa a disciplina espiritual da ação, ele é muito superior.

Explicação: Este verso ensina que o verdadeiro crescimento espiritual ocorre quando uma pessoa é capaz de controlar seus sentidos e agir altruisticamente, sem apego ao material. Só então ele pode alcançar o equilíbrio interior e a perfeição espiritual.

3-8

Cumpra o seu dever determinado, pois a ação é superior à inação. Mesmo a manutenção do seu corpo não seria possível sem ação.

Explicação: Neste verso, Krishna encoraja Arjuna a cumprir seu dever determinado e explica que a ação é superior à inação. Embora a vida espiritual às vezes enfatize a abstenção de ações, Krishna indica que a ação é necessária e importante. Mesmo a manutenção do corpo requer ação, e a inação não traz nenhum benefício para o homem.

3-9

O trabalho realizado como um sacrifício ao Supremo deve ser feito, caso contrário, o trabalho se prende a este mundo material. Portanto, ó filho de Kuntī, cumpra seus deveres determinados para agradá-Lo, e dessa forma você sempre permanecerá livre de obrigações.

Explicação: O conceito de sacrifício aqui se refere à ação altruísta e à ação que é realizada para o bem de Deus ou de toda a sociedade, e não para a satisfação de desejos pessoais. Krishna encoraja Arjuna a agir livre do apego aos resultados e a cumprir seus deveres, vendo-os como uma oferenda dedicada a um propósito superior.

3-10

No início da criação, o Senhor de todas as gerações criou as gerações com deveres específicos e o sacrifício a Ele, e as abençoou, dizendo: Sejam felizes com este sacrifício, pois a sua realização lhes dará tudo o que desejam para a vida e para alcançar a libertação.

Explicação: Neste verso, Krishna se refere ao ato original da criação, quando o Criador criou os seres vivos junto com o princípio do sacrifício. O sacrifício aqui simboliza a ação que é realizada altruisticamente e dedicada a um propósito superior. O Criador disse que, realizando sacrifícios (ações altruístas), os seres vivos poderão se multiplicar e viver em prosperidade. O sacrifício ou ação altruísta harmoniza os desejos humanos com a vontade Divina, garantindo assim a verdadeira realização. Isso significa que, cumprindo seus deveres como sacrifícios - altruisticamente e com consciência Divina, as pessoas podem atingir seus objetivos e realizar seus desejos em harmonia com o Universo. Este verso ensina que a ação como sacrifício é importante não apenas para o bem-estar pessoal, mas também para a ordem e harmonia geral do mundo. Somente quando as pessoas cumprem seus deveres altruisticamente, elas podem garantir o bem-estar para si mesmas e para toda a sociedade.

3-11

As entidades celestiais, satisfeitas com o sacrifício, também o agradarão, e assim, com a cooperação entre humanos e entidades celestiais, reinará a prosperidade de todos.

Explicação: Neste verso, Krishna explica o princípio da cooperação mútua e harmonia entre humanos e seres Divinos. Ao realizar sacrifícios e honrar as divindades (que simbolizam as forças da natureza e as energias cósmicas), as pessoas recebem bênçãos Divinas. Assim, quando as pessoas honram as Divindades, as Divindades as abençoam com prosperidade e sucesso. Este sistema de apoio mútuo significa que as pessoas, realizando sacrifícios altruístas e mantendo a harmonia com as Divindades, contribuem para a ordem e o equilíbrio do mundo. Quando humanos e Divindades cooperam mutuamente, todos obtêm o benefício máximo.

3-12

Em resposta ao fornecimento das conveniências da vida, as entidades celestiais, satisfeitas com a realização de sacrifícios, irão provê-lo com tudo o que for necessário. Mas aquele que desfruta desses presentes sem oferecer nada em troca é certamente um ladrão.

Explicação: Neste verso, Krishna enfatiza que os seres Divinos fornecem aos humanos os recursos necessários para a vida (prazeres, meios de subsistência) se forem honrados com sacrifícios. No entanto, o homem deve agir altruisticamente e devolver parte desses recursos às Divindades (por exemplo, através de sacrifícios ou ação altruísta). Ladrão é aquele que desfruta das bênçãos mundanas, mas não oferece nada em troca à sociedade ou ao princípio Divino, violando assim a lei do equilíbrio da natureza. Isso significa que, se uma pessoa desfruta das bênçãos mundanas, mas não oferece nada em troca à sociedade ou ao princípio Divino, ela está agindo de forma egoísta e não está vivendo de acordo com os princípios da harmonia.

3-13

Os devotos do Senhor libertam-se de todos os pecados comendo o alimento que primeiro foi oferecido em sacrifício. Outros, que preparam comida para o próprio prazer sensorial, em verdade, apenas comem pecado.

Explicação: Neste verso, Krishna explica que as pessoas que vivem altruisticamente e agem de acordo com o princípio do sacrifício são libertadas dos seus pecados. Aqueles que participam no sacrifício e comem o que sobra do sacrifício (que simboliza uma vida altruísta e a partilha com os outros) obtêm pureza espiritual e libertação das consequências das suas ações. Por outro lado, aqueles que vivem apenas para si e preparam alimentos ou obtêm recursos apenas para o seu próprio benefício são pecadores, pois agem de forma egoísta. Desta forma de vida, eles na verdade só comem pecado, o que significa que as suas ações promovem ações negativas e os prendem ao sofrimento mundano. Este verso ensina que, vivendo altruisticamente e partilhando com os outros, uma pessoa pode alcançar pureza espiritual e paz interior. Aqueles que agem de forma egoísta inevitavelmente acumulam ações negativas que os levam ao sofrimento espiritual.

3-14

Todas as entidades vivas subsistem dos cereais que nascem da chuva, que é produzida pelo sacrifício, e o sacrifício surge do cumprimento dos deveres prescritos.

Explicação: Este verso ensina que a interdependência entre ações e a natureza é importante para manter a ordem mundial. Esta ordem baseia-se no ciclo da natureza, que é mantido pelo cumprimento dos deveres e pela doação. Só se as pessoas viverem de acordo com os princípios espirituais e realizarem as suas ações altruisticamente é que se garante um ciclo harmonioso que sustenta todas as entidades vivas.

3-15

Os deveres prescritos são descritos nas escrituras védicas, e as escrituras védicas vêm diretamente do Senhor Supremo. Portanto, a presença Divina omnipresente encontra-se sempre nas ações de sacrifício.

Explicação: Neste verso, Krishna continua a explicar o princípio da interdependência entre ação, sacrifício e realidade espiritual. Ele salienta que toda a ação (ato) surge da consciência Divina — o Espírito Supremo que permeia toda a existência. A própria consciência Divina surgiu do princípio imortal e eterno, que não tem princípio nem fim. O sacrifício é aqui destacado como um elemento importante da expressão da consciência Divina. A consciência Divina, que tudo permeia, está sempre presente e existe no sacrifício. Isto significa que, ao realizar sacrifícios ou ações altruístas, uma pessoa harmoniza-se com a consciência Divina e mantém a ordem cósmica.

3-16

Meu querido Arjuna, aquele que na vida humana não segue tal ciclo de sacrifício estabelecido pelos Vedas, certamente vive uma vida pecaminosa. Vivendo unicamente para a satisfação dos sentidos, tal pessoa vive em vão.

Explicação: Neste verso, Krishna avisa que uma pessoa que não observa as leis naturais e cósmicas e não se envolve em ações altruístas ou sacrifício, vive uma vida inútil e pecaminosa. O ciclo da vida inclui ações que mantêm a harmonia entre o homem e o Universo, e estas devem ser realizadas com uma mente altruísta e dedicação.

3-17

Mas aquele que encontra alegria no seu próprio ser, cuja vida humana é voltada para a auto-realização e que está satisfeito apenas consigo mesmo, totalmente satisfeito, não tem nenhum dever.

Explicação: Neste verso, Krishna aponta para a realização do estado espiritual superior. Uma pessoa que está satisfeita consigo mesma e cuja alegria vem do seu estado interior é autossuficiente e já não depende de circunstâncias ou ações externas para alcançar a paz ou a felicidade. Tal pessoa já não precisa de realizar os deveres prescritos para as pessoas comuns, porque alcançou a perfeição espiritual.

3-18

Uma pessoa auto-realizada não tem de aspirar a nenhum objetivo ao cumprir os seus deveres prescritos, nem tem qualquer razão para não realizar tal trabalho. Também não precisa de depender de nenhuma outra entidade viva.

Explicação: Este verso ensina que a verdadeira liberdade espiritual surge quando uma pessoa já não depende dos frutos da ação e não se apega nem às ações nem a outras pessoas para alcançar a sua felicidade ou paz. Essa liberdade leva à independência interior e ao equilíbrio espiritual.

3-19

Portanto, sem apego aos frutos da ação, deve-se agir por dever, pois, agindo sem apego, alcança-se o Supremo.

Explicação: Neste verso, Krishna exorta Arjuna e outros a seguirem o princípio da disciplina da ação-espiritual — realizar os seus deveres altruisticamente e sem apego aos resultados. Isto significa que uma pessoa deve continuar a agir e a cumprir as suas tarefas, mas não se deve apegar aos resultados das ações, nem bons nem maus. Uma pessoa deve agir por dever, e não motivada por desejos pessoais.

3-20

Reis como Janaka alcançaram a perfeição apenas através do cumprimento dos seus deveres prescritos. Portanto, mesmo que seja para educar as pessoas simples, deves realizar o teu trabalho.

Explicação: Neste verso, Krishna dá o exemplo de governantes santos como Janaka, que alcançaram a perfeição não através da passividade ou da renúncia à ação, mas através de ações realizadas para o bem da sociedade. Krishna enfatiza que a realização de ações é importante não só para o crescimento espiritual pessoal, mas também para o bem-estar do mundo.

3-21

O que quer que um grande homem faça, os outros também fazem. O padrão que ele estabelece é seguido por todo o mundo.

Explicação: Este verso ensina que as pessoas que ocupam posições de responsabilidade ou são líderes têm uma responsabilidade para com a sociedade, pois as suas ações determinam como os outros agirão. O exemplo de boas ações promove a harmonia e o crescimento da sociedade, enquanto um mau exemplo pode levar a consequências negativas para toda a sociedade.

3-22

Ó Pārtha, em todos os três sistemas planetários, não há trabalho que Eu tenha de realizar. Nada me falta e nada preciso obter, no entanto, Eu ajo, cumprindo o dever prescrito.

Explicação: Neste verso, Krishna salienta que Ele, como o Ser Supremo, não tem deveres nem objetivos nos três mundos - nos céus, na terra e no submundo - que precise de alcançar. No entanto, Ele continua a realizar ações para manter a ordem mundial e dar o exemplo correto. Isto significa que, embora a perfeição espiritual seja um estado em que uma pessoa já não depende das ações, a ação ainda é necessária para apoiar a sociedade e o bem-estar do mundo.

3-23

Pois, se alguma vez Eu deixasse de executar os deveres prescritos, ó Pārtha, certamente todos os homens seguiriam o Meu caminho.

Explicação: Krishna está a enfatizar que, mesmo que não precise realizar ações, Ele continua a agir para evitar que a sociedade se torne preguiçosa ou irresponsável. O poder do exemplo é extremamente importante, pois outras pessoas tendem a seguir o exemplo dos líderes. Se Krishna parasse de agir, isso poderia causar caos no mundo, pois as pessoas seguiriam esse exemplo e deixariam de cumprir os seus deveres. Este verso ensina que a responsabilidade e a ação são essenciais, mesmo que uma pessoa tenha alcançado a perfeição espiritual. Agir corretamente e dar o exemplo são importantes para manter a ordem social e promover o bem-estar geral.

3-24

Se Eu não Me envolvesse em ação, todos estes mundos pereceriam. Eu criaria população indesejada e, assim, perturbara a paz de todos os seres.

Explicação: Neste verso, Krishna explica que, se Ele deixasse de cumprir os Seus deveres, isso causaria caos e colapso em todo o mundo. Todos os seres vivos seriam destruídos e a ordem mundial estaria em perigo. Krishna enfatiza que a continuidade da ação é essencial para manter a ordem cósmica e a harmonia no mundo.

3-25

Assim como os ignorantes executam os seus deveres apegados aos resultados, o sábio deve agir sem apego, para guiar as pessoas pelo caminho certo.

Explicação: Neste verso, Krishna explica a diferença entre uma pessoa ignorante e uma pessoa sábia. As pessoas ignorantes agem apegadas às ações e aos seus resultados, pois acreditam que as ações são a única maneira de atingir os seus objetivos. Por outro lado, uma pessoa sábia percebe que a ação em si é uma parte inerente da vida, mas realiza as suas ações sem apego aos resultados. Uma pessoa sábia age para manter a ordem mundial e ajudar a sociedade, e não para benefício pessoal.

3-26

Para não perturbar as mentes dos ignorantes, que se apegam aos frutos da ação, o sábio não os deve dissuadir de agir. Melhor, agindo com consciência espiritual, que ele os envolva em todas as ações.

Explicação: Neste verso, Krishna aconselha as pessoas sábias sobre como devem abordar aqueles que não entenderam a verdade espiritual e que estão apegados às atividades materiais. As pessoas sábias não devem confundir ou perturbar os ignorantes com o seu profundo conhecimento espiritual, pois isso pode causar incerteza e confusão. Em vez disso, devem encorajar os ignorantes a cumprir os seus deveres e dar o exemplo, agindo altruisticamente e com compaixão, inspirando assim outros a seguirem o caminho espiritual.

3-27

Todas as ações são realizadas sob a influência das qualidades da natureza material, mas aquele que está iludido pelo egoísmo pensa: 'Eu sou o fazedor'.

Explicação: Este verso aponta para a ilusão do egoísmo que faz uma pessoa sentir-se como o autor das ações, quando na verdade tudo acontece sob a influência das forças materiais e das leis do Universo. Uma pessoa espiritualmente evoluída percebe que é apenas uma testemunha e compreende que a natureza material é a verdadeira executora das ações.

3-28

A pessoa que conhece a Verdade Absoluta, ó forte de braços, não se envolve em satisfação dos sentidos, conhecendo bem a diferença entre a ação para a própria satisfação e a ação dedicada ao dever.

Explicação: Uma pessoa que compreende a Verdade Absoluta e a natureza da ação, percebe que as ações e as consequências surgem das qualidades materiais (bondade, paixão e ignorância), portanto não se percebe como o fazedor e permanece desapegada das ações e resultados mundanos. Vê que as ações são realizadas por si mesmas, devido à natureza material, e não pela sua própria vontade. Mahābāho (de braços poderosos) é uma forma de se dirigir a Arjuna, usada por Krishna para enfatizar a força e a bravura de Arjuna.

3-29

Iludidos pelas qualidades da natureza material, os ignorantes entregam-se por completo às atividades materiais e apegam-se a elas. Embora, devido à ignorância, os deveres dessas pessoas sejam de pouco valor, o sábio, que tudo sabe, não os deve perturbar.

Explicação: Este verso indica que uma pessoa sábia ajuda os outros com compaixão e humildade, mas não tenta impor-lhes um conhecimento mais profundo se eles ainda não estiverem prontos para isso. As pessoas ignorantes vivem na sua própria perceção do mundo, onde se apegam às suas ações e aos seus resultados, e se lhes forem impostos ensinamentos mais profundos muito cedo, isso pode causar confusão ou reações negativas.

3-30

Portanto, ó Arjuna, dedicando todas as tuas obras a Mim, com total compreensão de Mim, sem desejo de ganho pessoal, sem reivindicações de propriedade, livre de letargia, luta!

Explicação: A libertação do egoísmo e do apego é essencial para que uma pessoa possa agir plenamente, mantendo o equilíbrio espiritual. Krishna encoraja Arjuna a lutar e a cumprir o seu dever como guerreiro, mas com uma mente livre de inquietação interna, para que possa agir altruisticamente e com perfeita paz, compreendendo que está a agir dentro da vontade Divina.

3-31

Aqueles que cumprem os seus deveres de acordo com as Minhas instruções e seguem este ensinamento com fé e sem inveja, libertam-se das amarras das consequências da ação.

Explicação: Neste verso, Krishna afirma que aqueles que seguem consistentemente os Seus ensinamentos com fé e sem ceticismo ou inveja, obtêm a libertação das consequências da ação. Ele enfatiza que, ao aceitar o ensinamento com uma mente crente, as pessoas podem sair do ciclo de ação que as prende às atividades mundanas e às suas consequências. Fé e confiança são essenciais para a libertação das consequências negativas da ação.

3-32

Mas aqueles que, por inveja, não seguem estas Minhas instruções e não praticam regularmente este ensinamento, devem ser considerados como iludidos em todo o conhecimento e destinados ao sofrimento e a uma vida irracional.

Explicação: As pessoas que não seguem ou rejeitam os ensinamentos de Krishna são consideradas como tendo destruído as suas oportunidades de alcançar a liberdade espiritual, pois carecem de compreensão da essência da vida. Krishna apela a estas pessoas para que se voltem para a fé e a disciplina espiritual, pois, ao ignorarem este caminho, perdem a paz interior e o verdadeiro significado da vida.

3-33

Até mesmo uma pessoa sábia age de acordo com a sua natureza, pois todo ser segue a natureza que adquiriu a partir das três qualidades. O que pode a repressão fazer?

Explicação: Neste verso, Krishna explica que mesmo que uma pessoa tenha conhecimento espiritual, ela ainda age de acordo com a sua natureza inata. A natureza material tem certas qualidades que influenciam o comportamento de todos os seres. Krishna enfatiza que reprimir ou lutar contra essa natureza é inútil, pois as qualidades naturais sempre influenciarão o comportamento de uma pessoa. Em vez de tentar suprimir completamente as suas qualidades, uma pessoa deve entender a sua natureza material e procurar usar as suas qualidades naturais para servir a Deus e promover o bem-estar da sociedade. De acordo com a sua natureza, significa que o comportamento e as ações de uma pessoa são influenciados pelas suas qualidades e personalidade inatas, que são formadas pela estrutura da sua mente e carácter, tais como: temperamento e emoções, escolhas de carreira, atitude perante os desafios, inclinações espirituais, relações sociais, responsabilidade para com a família e a sociedade.

3-34

No contacto dos sentidos com os seus objetos, surgem a afeição e a aversão, mas uma pessoa não deve ficar sob o seu domínio, pois são obstáculos no caminho do crescimento espiritual.

Explicação: Neste verso, Krishna explica que os sentidos de uma pessoa são sempre atraídos para certos objetos, causando tanto afeição como aversão. Estas reações são naturais, no entanto, Krishna avisa que uma pessoa não deve deixar estas emoções dominá-la. A afeição e a aversão são duas forças poderosas que podem levar uma pessoa ao desequilíbrio espiritual e obstruir o seu caminho para a libertação. Estas emoções devem ser superadas para alcançar a paz interior e a liberdade espiritual.

3-35

É melhor cumprir o próprio dever, mesmo que seja imperfeito, do que cumprir perfeitamente o dever de outrem. Morrer a cumprir o próprio dever é melhor; o dever de outrem é cheio de perigo.

Explicação: Este verso ensina que cada pessoa deve cumprir o seu dever na vida, que é o caminho individual, a responsabilidade ou a missão de cada pessoa, que está de acordo com o seu carácter, habilidades, talentos, estatuto social e circunstâncias de vida. É um caminho natural da vida que ajuda uma pessoa a viver em harmonia consigo mesma e com o mundo, realizando as ações que correspondem à sua natureza inerente e ao seu papel na sociedade. Mesmo que uma pessoa cometa erros no seu dever ou não o cumpra perfeitamente, é melhor do que tentar realizar um dever alheio que não esteja relacionado com o seu próprio caminho de vida.

3-36

Arjuna disse: Ó descendente de Vārṣṇeya, por que razão uma pessoa é levada a agir pecaminosamente, mesmo contra a sua vontade, como se fosse forçada?

Explicação: Neste verso, Arjuna faz uma pergunta a Krishna, procurando entender por que razão uma pessoa, mesmo que não queira fazer o mal ou pecar, muitas vezes é forçada a realizar ações erradas. Ele pergunta o que leva uma pessoa a cometer pecado mesmo contra a sua própria vontade, como se fosse guiada por uma força que está fora do seu controlo. Vārṣṇeya é a forma como Arjuna se dirige a Krishna, que significa aquele que vem da dinastia Vriṣṇi. Ao usar esta forma de tratamento, Arjuna mostra respeito e confiança em Krishna como um professor espiritual e pergunta-lhe com honra e humildade.

3-37

A Suprema Personalidade de Deus disse: Ó Arjuna, é a luxúria que nasce do contacto com o modo da paixão e que depois se transforma em ira, e que é o inimigo pecaminoso e abrangente deste mundo.

Explicação: Desejo e raiva são grandes inimigos, pois causam agitação e destroem a paz de espírito. Consomem o equilíbrio interno de uma pessoa e fazem-na fazer coisas que causam pecados. O desejo é o que causa paixão e inquietação e, quando os desejos não são satisfeitos, transformam-se em raiva, o que perturba a paz interior de uma pessoa e leva a ações erradas. Estes desejos e raiva surgem da qualidade da paixão, que é uma qualidade da natureza material que cria inquietação, paixão e sede de satisfação.

3-38

Assim como o fogo é coberto pela fumaça, como o espelho é coberto pela poeira, como o embrião é coberto pelo ventre, da mesma forma o ser vivo é coberto por diferentes graus desse desejo.

Explicação: Os desejos são o principal obstáculo que obscurece a clareza da mente de uma pessoa e a impede de ver a verdade sobre si mesma e sobre o mundo. Estas três comparações indicam diferentes níveis de desejo que podem interferir no crescimento espiritual de uma pessoa. Assim como o fogo acaba por conseguir passar pelo fumo, também uma pessoa pode dissolver os seus desejos com disciplina espiritual e autocontrolo para revelar a sua verdadeira natureza, que é a imortalidade e a unidade da alma com Deus.

3-39

Assim, a consciência pura do ser vivo é coberta pelo seu eterno inimigo – a luxúria – que nunca se satisfaz e queima como o fogo.

Explicação: Neste verso, Krishna explica que o desejo é o inimigo eterno do homem, que ofusca o seu conhecimento e sabedoria. O desejo causa ofuscação e impede que uma pessoa veja a verdade e viva de acordo com o conhecimento espiritual. Krishna compara o desejo ao fogo que está sempre a arder, mas nunca está satisfeito - quer sempre mais. Neste verso, Krishna dirige-se a Arjuna como filho de Kunti, lembrando-o da sua nobre linhagem e da força de um guerreiro.

3-40

Os sentidos, a mente e a inteligência são os locais de residência deste desejo. Através deles, o desejo obscurece o verdadeiro conhecimento e ilude o ser encarnado.

Explicação: Os sentidos são o primeiro lugar onde o desejo começa a operar, pois uma pessoa quer desfrutar do mundo através da visão, audição, tato, paladar e olfato. A partir daqui, o desejo entra na mente, criando emoções e agitação. Depois influencia o intelecto, que é o poder de tomada de decisões de uma pessoa, enganando-o e desviando-o do caminho correto. Quando o desejo obscurece o conhecimento de uma pessoa, ela esquece a sua verdadeira natureza espiritual e torna-se escrava dos desejos materiais. O desejo engana a pessoa e impede-a de alcançar a liberdade espiritual e a paz interior.

3-41

Portanto, ó Arjuna, o melhor dos Bharatas, desde o início controla este grande símbolo do pecado, a luxúria, restringindo os sentidos, e mata este destruidor do conhecimento e da autorrealização.

Explicação: Neste verso, Krishna dá conselhos a Arjuna sobre como superar o desejo, que destrói o conhecimento e a compreensão espiritual de uma pessoa. O primeiro passo que uma pessoa pode dar é controlar os seus sentidos. Os sentidos são aqueles através dos quais os desejos entram na mente de uma pessoa e a capturam, portanto, ao controlar os sentidos, uma pessoa pode limitar a influência dos desejos. Neste verso, Krishna dirige-se a Arjuna como o melhor descendente de Bharata, honrando-o pela sua nobre linhagem e força. Serve como um lembrete de que Arjuna tem força espiritual e responsabilidade para superar a influência dos desejos.

3-42

Os sentidos ativos são superiores à matéria, a mente é superior aos sentidos, a inteligência é ainda superior à mente, e ele (a alma) é ainda superior à inteligência.

Explicação: Neste verso, Krishna explica a hierarquia interna de uma pessoa. Ele aponta que existem vários níveis que regulam o comportamento e a perceção de uma pessoa, e que estes níveis formam uma ordem hierárquica. Este verso ensina sobre a estrutura interna de uma pessoa e que a alma é a essência mais elevada de um ser humano, que está acima dos sentidos, da mente e do intelecto. Para alcançar a paz interior e a liberdade espiritual, uma pessoa deve controlar estes níveis inferiores e alcançar a consciência da alma.

3-43

Assim, ó Arjuna de braços fortes, sabendo que a alma é transcendental aos sentidos materiais, à mente e à inteligência, deve-se aquietar a mente com inteligência espiritual resoluta e conquistar a luxúria, este inimigo insuperável.

Explicação: Neste verso, Krishna conclui o seu ensinamento sobre os desejos e como eles afetam o ser humano. Ele indica que, para superar os desejos, a pessoa primeiro deve perceber que a alma é superior ao intelecto e à mente. Só quando a pessoa percebe a sua verdadeira natureza espiritual é que ela pode usar a mente para se controlar e superar o desejo. Aqui, Krishna dirige-se a Arjuna como o de braços fortes, o que é um elogio à sua força física e heroísmo. No entanto, neste contexto, o endereço indica a força espiritual de Arjuna – ele não só tem força para lutar fisicamente, mas também a força interior necessária para vencer o desejo, que é o maior inimigo interior do homem.

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